quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Saudades da vovó



Todos passam por aquele lugar, mas ninguém sabe o que ele significa para mim. Talvez a geração passada, a de minha mãe e a de meus tios, tenha outro significado totalmente diferente do meu. As novas, nem sequer sabem da importância que aquilo teve para a minha vida, nem terá para eles. Para eles aquilo é um monte de lixo que só serve para encher de pó e de cama de gato.

Olho para aquilo e engulo seco, fico triste, lembro-me da minha vovó que já se foi. Uma legítima japonesa. Como todo japonês, com heranças de costumes e cultura severa. A minha vó não foi diferente, era séria, organizada, responsável e trabalhadora. Mas quando um de seus netinhos se aproximava, o seu coração amolecia, e vivíamos ganhando bala e chocolate que ela escondia dos outros da casa, esperando a nossa ida para nos dar.

Aquilo funcionava a todo vapor, nunca apagava, tinha vida. Alimentado pela minha vó, lá ela fazia as comidas mais gostosas que já comi na minha vida. Se eu pedisse o mesmo prato para um dos melhores restaurantes da cidade, ele não conseguiria fazer igual. Eram ensopados, feijoada, bacalhoada, doce, tudo era feito lá.

Todas as vezes que eu e meus primos a visitávamos, a sua felicidade se resumia em ir par o terraço e pegar quatro frangos para preparar um ensopado para os familiares. Todos eram proibidos de colocar a mão para ajudá-la. Ela mesma se encarregava de tudo. O cheiro que aquilo exalava pelo sítio enquanto alguns jogavam conversa fora, outros brincavam de bola ou andavam de bicicleta era extasiante. Um cheiro de lenha queimada, com comida fresca. Que saudade de tudo aquilo!

Mas o tempo foi passando, sua vista era impecável, sua audição era exuberante, tinha uma força e tanto, porém, a sua memória começou a dar o seu adeus. Não lembrava mais quem era quem ou o que estava fazendo. Aos poucos o forno a lenha foi parando de funcionar, até que o seu coração cessou, e o da minha vovó também.

Hoje eu olho para aquilo e vejo que tempos são tempos, jamais serão iguais. Em minha memória guardo os momentos felizes que passei quando era criança, nunca vou esquecer a felicidade da minha vó preparando comida o dia todo para as suas visitas e os doces ganhos. Tempos que não voltam mais, e infelizmente, jamais voltará.